Geoffrey Hinton, da Universidade de Toronto, e John Hopfield, da Universidade de Princeton, usaram ferramentas da física para desenvolver seus trabalhos em Redes Neurais e Machine Learning

Os cientistas John Hopfield e Geoffrey Hinton, ganhadores do Prêmio Nobel de Física de 2024, foram reconhecidos por suas contribuições fundamentais ao campo da Inteligência Artificial (IA).
Hopfield, um biólogo teórico com formação em física, foi pioneiro ao descrever, em 1982, um modelo de rede neural que simulava o funcionamento de memórias associativas no cérebro humano, permitindo que padrões fossem armazenados e recuperados a partir de informações incompletas. Essa abordagem abriu novas possibilidades para a criação de sistemas que replicam, de forma simplificada, o aprendizado humano.
Por outro lado, Geoffrey Hinton, cientista da computação, expandiu os conceitos de Hopfield ao desenvolver métodos que permitem a identificação autônoma de padrões em grandes conjuntos de dados. Essa inovação facilitou a realização de tarefas complexas, como a classificação de imagens, tornando o aprendizado de máquina mais eficiente e eficaz.
“Ambos desenvolveram as técnicas que fundamentam muitas das inovações em inteligência artificial que observamos hoje. Seus trabalhos são essenciais para diversos sistemas, incluindo o ChatGPT, que utiliza redes neurais, um campo em que ambos foram pioneiros”, afirma Alberto Paccanaro, professor da Escola de Matemática Aplicada da Fundação Getulio Vargas (FGV EMAp).
Paccanaro conhece Hinton de perto, já que o britânico foi seu orientador de doutorado na Universidade de Toronto, concluído em 2002.
“Foi uma alegria e uma surpresa ver meu ex-orientador receber o Nobel. Fiquei surpreso, pois Hinton não é físico de formação. Como a Ciência da Computação e a Matemática não possuem uma categoria específica no Nobel, acredito que o comitê quis reconhecer o desenvolvimento da inteligência artificial”, explicou Paccanaro.

O professor ressaltou ainda que Hinton e Hopfield desafiaram métodos tradicionais da física ao criar simulações inovadoras. As redes neurais provaram ser ferramentas cruciais para analisar dados complexos e criar algoritmos de aprendizado de máquina. “As contribuições deles não apenas moldaram a IA como a conhecemos, mas também abriram caminho para inovações que continuarão impactando a sociedade em várias dimensões”, completou Paccanaro.

Redes neurais e aprendizado de máquina
O desenvolvimento das redes neurais começou nas décadas de 1940 e 1950, com as primeiras tentativas de modelar o funcionamento do cérebro humano por meio de neurônios artificiais. O campo enfrentou desafios teóricos nas décadas seguintes, mas foi revitalizado nos anos 1980 pelas pesquisas de Hopfield e Hinton, que trouxeram novas abordagens e avanços.

De acordo com o professor da FGV EMAp, as redes neurais são essenciais para a inteligência artificial, sendo utilizadas em diversas aplicações, como reconhecimento de fala, visão computacional, biologia computacional e sistemas de recomendação. O impacto dessas pesquisas é evidente no desenvolvimento de tecnologias que aprendem com dados e se tornam progressivamente mais eficazes em identificar padrões, classificar informações e resolver problemas complexos.
Além de seu legado no campo das redes neurais, Hinton e Hopfield abriram portas para novas abordagens interdisciplinares em inteligência artificial. Para Paccanaro, essa colaboração entre disciplinas é essencial: “Para enfrentar desafios complexos em áreas como biologia computacional, medicina e farmacologia, é crucial ter um entendimento básico da disciplina em questão. Não é necessário ser especialista em todas as áreas, mas entender o suficiente para colaborar efetivamente com outros pesquisadores”.
O Paccanaro Lab, coordenado por Alberto Paccanaro, desenvolve pesquisas que aplicam técnicas avançadas de aprendizado de máquina para resolver problemas nessas áreas, reafirmando que a colaboração interdisciplinar pode gerar soluções mais robustas e aplicáveis.

Apesar dos avanços, o futuro da inteligência artificial traz preocupações. Hinton, que deixou seu cargo como consultor no Google em 2023, alertou para os riscos associados ao uso da IA em cenários como o desenvolvimento de robôs militares e armas inteligentes. Paccanaro acredita que, com o reconhecimento de seu trabalho, Hinton se tornará uma voz ainda mais influente na defesa da regulação adequada da IA, promovendo seu uso responsável.
Em um cenário no qual grandes empresas de tecnologia lideram o avanço da IA, Paccanaro ressalta a importância das instituições acadêmicas, que continuam a desempenhar um papel crucial ao se concentrar em questões fundamentais e inovadoras.