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Martin Tygel: a contribuição ‘rebelde’ para a SBMAC

Carioca uniu experiências para criar uma carreira de respeito, coroada com quatro anos à frente da entidade

Falar de Martin Tygel é se aprofundar em críticas construtivas para amadurecer o grupo em que está inserido. Foi assim desde os tempos de infância no Rio de Janeiro, em que sua personalidade forte e o gosto por discussões o fez enfrentar um Brasil em transformações tórridas em meio ao golpe militar. Viver, desde o início da vida adulta, foi sinônimo de abraçar as lutas. Não à toa, sua trajetória acadêmica foi marcada por não se limitar a uma mesma vocação. A Matemática veio a fundir o gosto do carioca nas Ciências Exatas. 

INFÂNCIA

Tygel nasceu em 22 de setembro de 1946, no ainda estado da Guanabara. O pós-guerra ainda era marcante para o cidadão de classe média do Rio com forte influência judaica na família. “A gente sempre teve um apreço muito grande pela educação. E para os imigrantes, a educação é a única coisa que não pode ser tirada deles”, recorda o carioca, que teve o privilégio de frequentar colégios particulares. 

No Ensino Médio, Tygel fez um exame para o Colégio de Aplicação do Rio de Janeiro, instituição federal que, até hoje, é ligada à formação de professores de universidades. E logo veio o apego pelas Ciências Exatas. “Sempre gostei muito de Matemática e Física, eram as áreas nas quais tinha interesse”, completa. 

Com isso, o vestibular após concluir o colegial foi uma ‘barbada’: Tygel passou em 2º lugar para o curso de Bacharelado em Física na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio). “Só fiquei atrás do Luiz Davidovich, que viria a ser depois presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC), com quem sempre tive uma relação muito boa”, conta, ao adicionar que também foi aprovado para o curso de Engenharia. 

“Para horror dos meus pais, não quis Engenharia. Eles queriam que eu fizesse algo útil, mas eu briguei com todo mundo e fiz Física mesmo”, brinca Tygel, que adentrou ao curso de Física no fim da década de 1960. 

ANOS DIFÍCEIS

Sua trajetória, após dois anos de graduação, foi interrompida pelo engajamento político. Martin participou de movimentos estudantis do Rio de Janeiro em meio ao Governo Costa e Silva e o início dos Anos de Chumbo no Brasil. A troca da PUC-Rio pela Universidade do Estado da Guanabara (UEG, atual UERJ) não foi nem o mais impactante para o então aluno de graduação, que tomou uma atitude drástica em 1969. 

“Um dia, meu pai falou: ‘Estiveram aqui em casa te procurando. É melhor você dar o fora!’”, lembra Tygel, que se mudou posteriormente para Salvador, onde fervia o início do Movimento Tropicalista, com Gilberto Gil, Caetano Veloso, Gal Costa, Maria Bethânia, entre outras celebridades da Música Popular Brasileira. 

Sem perturbação pela realidade sombria que o país atravessava, Tygel conseguiu se estabelecer na Universidade Federal da Bahia (UFBA), onde ganhou uma experiência marcante como monitor no curso de Licenciatura em Matemática. Um ano depois, seu advogado o avisou que o ‘Rio estava barra limpa’ e, assim, retornou à capital fluminense para se formar em 1969 pela UEG. 

GEOFÍSICA + MATEMÁTICA

O período como monitor em Salvador cativou Martin para fazer, pouco tempo depois, o Mestrado em Matemática em nova experiência pela PUC-Rio. Finalizou sua pós-graduação em 1973 e aproveitou o período para também se aventurar na vida de docente acadêmico. 

“Tinha decidido que queria ser professor, e não cientista. Eu achava que educação era muito importante”, justifica Tygel, que, a princípio, não se interessou em fazer seu Doutorado no Rio. 

Entretanto, através da bolsa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), ele teve a oportunidade de estudar na Universidade de Stanford, nos Estados Unidos. “Naquela época, eu não tinha tanto interesse em fazer Matemática Pura, mas queria algo com aplicação ao mundo real”, recorda Tygel. 

De 1974 a 1979, o carioca completou seu Doutorado em Stanford, mas mantinha vínculo com a PUC-Rio para retornar ao Departamento de Matemática. Entretanto, Tygel, sempre com seu lado aventureiro, foi convidado para atrelar Física e Matemática em uma função inovadora no Brasil. 

O então reitor da UFRN convidou Martin para um período de docência em Natal e, neste ínterim, a Petrobras inaugurou o Programa de Pós-Graduação em Geofísica para a exploração de petróleo no Nordeste. A Bahia foi o berço da atividade econômica, o que guiou ainda mais o caminho do carioca na região. 

“Minha missão era preparar os alunos em Matemática para fazer o Doutorado com estrangeiros. A ideia era a seguinte: esses professores e visitantes vinham ao Brasil, me diziam quais os temas com que gostariam de trabalhar e eram definidos os temas para cada pessoa do curso. E eu, como professor de Matemática do grupo, adaptava minhas aulas como ‘meio de campo’ para os temas deles. E foi uma experiência maravilhosa, pois começava a entrar em contato com a Geofísica”, narra Tygel. 

A SBMAC EM SUA VIDA

E foi nesta experiência no Nordeste brasileiro que nasceu sua relação com a SBMAC. No fim da década de 1970, o surgimento da área de Ciências da Computação gerou um choque social na área de Matemática de que “era necessário atender uma demanda de assuntos ligados à simulação de problemas”, lembra Tygel. 

Em 1984, ingressou na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), onde está até hoje como uma das referências em Matemática Aplicada do Instituto de Matemática, Estatística e Computação Científica (IMECC). Por uma década, avançou suas experiências na área acadêmica pela Europa, onde foi bolsista da Fundação Humboldt em Hanover, na Alemanha, e também professor visitante nas Universidades de Karlsruhe, também no país germânico. 

Em 1995, Tygel assumiu a presidência da SBMAC, onde permaneceu no cargo até 1999 e assumiu o desafio de fazer com que o ramo da Matemática Aplicada não se estreitasse a suas próprias fronteiras. 

“Eu sempre apoiei a SBMAC, onde sempre tivemos congressos muito bons, mas sempre havia uma dificuldade em fazer com que a Matemática Aplicada fosse realmente utilizada”, pondera Tygel. 

“E, durante aqueles anos, eu comecei a entender que, para fazer Matemática Aplicada como penso, é preciso sair da sua zona de conforto como matemático e se aventurar em coisas pantanosas, que é uma aplicação real. Por exemplo, em qualquer área como Biologia, Economia, Engenharia, você tem que não somente entender a sua parte, mas a parte do próximo para criar uma boa relação”, completa o ex-presidente da SBMAC, que permaneceu no cargo por dois mandatos.

Durante sua passagem pela presidência da entidade, Tygel conviveu com “pessoas maravilhosas, como o Professor Marco Antonio Raupp”, três vezes mandatário da SBMAC e ex-Ministro da Ciência e Tecnologia no governo de Dilma Rousseff.

Ao olhar para trás e ver seu caminho trilhado até hoje, Tygel se diz extremamente feliz por ter sido ‘rebelde’ na infância e optado pela Matemática. A SBMAC só veio a acrescentar a cereja do bolo. 

“O fato de as pessoas escolherem Matemática Aplicada e Pura já é um sinal de que elas querem se integrar mais ao mundo. Fico muito feliz por ter participado da SBMAC, mas sempre fica aquela sensação de que posso ajudar mais. Então, é uma mistura de felicidade e uma parte de que posso contribuir ainda. Estou sempre à disposição”, finaliza Tygel.

Confira o 16º episódio da série Memória SBMAC:

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