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Eduardo Souza de Cursi: a humildade de um dos sócios fundadores da SBMAC

Paulista participou do evento que criou a Sociedade em 1978 e contribuiu ferrenhamente para o desenvolvimento da revista Computational & Applied Mathematics, da qual é o atual editor-chefe

Trilhar uma carreira acadêmica em Ciências Exatas não foi exatamente a primeira opção do paulista Eduardo Souza de Cursi. Aliás, seus pensamentos na infância invadiram os cercos da Publicidade, ainda em sua cidade natal Adamantina, próximo da região de Presidente Prudente, na Alta Paulista.

“No começo, eu queria ser publicitário. Eu começava vendo um antigo programa da TV Tupi, quando eu era criança, em que havia uma análise das campanhas publicitárias. Aquilo me interessava e eu até me imaginava fazendo campanhas”, recorda. 

Pouco tempo depois, já quando estava no Ensino Médio, a Publicidade deu lugar ao Jornalismo, onde o jovem Eduardo chegou a escrever para a Tribuna do Povo e o Correio de Dracena, município também da região de Presidente Prudente. Deixou sua marca, inclusive, nas rádios dos veículos por alguns anos. 

“Gostava de trabalhar naqueles jornais de cidade pequena, que hoje nem existem mais, mas eu percebi que aquilo não me inspirava tanto. O que realmente me fascinava era a Ciência, de descobrir e entender o universo”, admite. 

Pensamento em Computação

A partir daí, Eduardo centralizou seus estudos para prestar o vestibular para o curso de Física. Em 1974, foi aprovado na Universidade de São Paulo (USP), mas precisou ‘ralar’ em seus primeiros anos na capital pela condição financeira.

Conseguiu um estágio no Hospital das Clínicas (HC), da USP, em que era responsável por analisar sinais cerebrais dos pacientes através do eletroencefalograma (EEG). E desde o primeiro ano, já começava a se encantar pela área de Computação. 

“Na época, não existia scanner. O que existia era o eletro. Com as medidas do eletroencefalograma em vários pontos, tentava-se encontrar as zonas do cérebro ativas. Já era a mesma ideia de hoje de encontrar uma relação entre zonas do cérebro ativas e as atividades das pessoas. Eu trabalhava fazendo as análises de sinais em um gigantesco computador de 32 KB de memória e um disco de alguns MB. E assim, eu comecei a me interessar pela Computação”, relata.

Nesta época, o paulista se interessou em aprimorar seus conhecimentos e teve aulas em uma escola de Computação na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Até 1978, mesclou as atividades de estágio e atividades em empresas privadas até a conclusão da graduação. Só que a paixão de Eduardo neste ínterim havia mudado. 

“A Física começou a me desinteressar. Eu percebi mais dessa área de Computação, mas eu decidi fazer Matemática Pura ao mesmo tempo. Então, eu entrei no segundo curso da USP, de Matemática Pura, e foi quando eu encontrei professores da área, como o Marco Antonio Raupp”, conta. 

Contato com a Matemática Aplicada

Começou ali o contato indireto de Eduardo com a SBMAC e ele recebeu, do próprio Raupp, o conselho de ‘recalcular’ a rota acadêmica. “Uma vez que eu tinha diploma de Graduação, o melhor era começar a Pós-Graduação. Então, comecei a Pós em Matemática Aplicada na USP e lá o Professor Raupp veio dar um curso de Elementos Finitos. E esse curso me interessou muito, já que via a relação entre a Matemática, a Informática e permitia resolver problemas concretos. Foi ali que achei a minha vocação”, recorda.

Em seguida, Eduardo rumou para o Rio de Janeiro, onde trabalhou com a orientação de Raupp, exatamente nos anos da revolução da Computação e da Matemática Aplicada. A criação da SBMAC foi somente a cereja deste bolo que já vinha em crescimento ao longo da década. 

No famoso Simpósio Nacional de Cálculo Numérico, em Belo Horizonte, em novembro de 1978, Eduardo estava presente e também é um dos sócios fundadores da SBMAC junto de Raupp, que seria eleito Presidente para o mandato de 1981 a 1985. 

O período com Raupp no Rio fez o paulista se apaixonar cada vez mais pela área onde estava adentrando. “Eu descobri um monte de gente que gravitava ao redor do Laboratório de Cálculo que tinham ideias que não eram exatamente da Matemática que existia até aquela época. Era algo que se situava entre Matemática, Computação e Engenharia. Foi assim que entrei definitivamente para essa área”, lembra. 

A sequência de sua trajetória reservou o Mestrado em Física em 1980 pelo Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas e, posteriormente, um período fora do Brasil para fazer seu Doutorado. A ideia de estudar no exterior também o fascinava, porém, pela primeira vez, contrariou as recomendações de Raupp para iniciar definitivamente a carreira como matemático aplicado. 

“O Professor Raupp tinha achado uma possibilidade para eu ir aos Estados Unidos. Mas um professor francês veio trabalhar no Laboratório de Cálculo, no Rio, e me convidou para ir para a França. E eu preferi trabalhar na França”, explica o paulista, que se especializou em Matemática Aplicada na conceituada Universidade de Ciência e Tecnologia de Languedoc, em 1991.

A década investida no Velho Continente não fez Eduardo perder contatos com o Brasil, especialmente com Raupp, a quem enxerga como um grande pioneiro para a Matemática Aplicada e Computacional no país. 

“Com o desenvolvimento da Informática, foi possível resolver problemas que a gente não conseguia solucionar anteriormente. O Professor Raupp foi uma pessoa chave para esse desenvolvimento, pois ele agregou em torno do Laboratório de Cálculo vários pesquisadores, como Luiz Adauto, o Carlos Moura, o Gustavo Perla, um monte de pessoas que trabalhavam na área, porém estavam dispersas naquela época. O fato de ter criado essa massa crítica, de ter criado as escolas, deu visibilidade a essa área e permitiu o fomento da Matemática Aplicada no Brasil”, analisa. 

Contribuições para a SBMAC

Mesmo como sócio fundador, o cientista mostra uma postura para lá de humilde e considera que suas contribuições foram muito modestas. Recebeu um convite para iniciar os trabalhos na revista da SBMAC como editor associado e sua trajetória se estendeu até os dias atuais, ocupando o cargo de editor-chefe da Computational & Applied Mathematics (COAM).

Eduardo enxerga que a revista é um dos legados deixados por Raupp e mostra o quanto a ciência brasileira, em especial a Matemática Aplicada, é fortíssima no cenário internacional. 

“Essa revista tem um papel muito importante no desenvolvimento da SBMAC, pois é de nível internacional e fez a Matemática brasileira progredir muito. E se você analisar a revista, vai perceber que a produção dos brasileiros não é baixa. Há uma grande quantidade de artigos brasileiros e que reforça o nível da ciência brasileira no exterior”, corrobora. 

Hoje, Eduardo continua como uma das maiores referências em Matemática Aplicada e Mecânica Teórica, com ênfase em Análise Numérica, Métodos Estocásticos e Análise Convexa no cenário acadêmico internacional. 

O paulista é Professor Titular no Instituto Nacional de Ciências Aplicadas de Rouen, Diretor do Laboratório de Mecânica da Normandia e Diretor de Relações Europeias e Internacionais do INSA, também de Rouen. Sua influência permitiu participar da criação do Brasil France Ingénieur Technologie (Brafitec), programa de intercâmbio desenvolvido no âmbito da cooperação entre o Brasil e a França. 

Mesmo com tantos compromissos no exterior, Eduardo projeta o Brasil entre as maiores potências da área no futuro a curto prazo. E a evolução só tende a impulsionar o trabalho da SBMAC, onde é um dos poucos associados honorários, a abraçar a ideia do desenvolvimento de técnicas e aplicações de áreas distintas da Ciência. 

“A Ciência nunca para de evoluir, vão aparecer novas técnicas de computação, todos esses desenvolvimentos vão levar provavelmente a novos problemas e novas soluções. Espero que a SBMAC continue adotando essa iniciativa de ajudar a desenvolver técnicas de aplicações distintas, mas que se complementam. Esse desenvolvimento é importante, contribui muito para a Ciência brasileira, pois permite discussões e análise de métodos diferentes e traz inspiração para as pessoas”, finaliza Cursi.

Confira o 22º episódio da série Memória SBMAC:

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